Certamente, você já possui a seguinte percepção acerca da situação que estamos vivendo: a decadência e o conseqüente colapso civilizacional. Por isso, quero te convidar a refletir sobre a razão pela qual tudo o que amamos está sendo destruído bem diante dos nossos olhos.
Na era do Big Brother e de outros reality shows, assistir à vida privada de outras pessoas tornou-se comum. Problema maior que esse é assistir a decadência de civilizações — e também da civilidade — na realidade mesma.
Essa era foi prevista literariamente na obra 1984, de George Orwell, escrita ainda em 1949. Nela, um dos modos para controlar as mentes e os pensamentos é a vigilância constante.
O Grande Irmão — ou Big Brother, donde surgiu o nome do famoso reality show — vigia constantemente os habitantes de Oceania, por meio das teletelas: aparelhos instalados em todas as casas e ruas que, ao mesmo tempo em que transmitem uma programação destinada a promover lavagem cerebral em favor do partido Ingsoc (Socialismo Inglês, criado na ficção de Orwell), servem também como câmeras de vigilância sobre os habitantes. E elas nunca podem ser desligadas.
Na URSS, o Partido Comunista empregava instrumentos semelhantes: caixas de som em cada casa que nunca poderiam ser desligadas, transmitindo 24 horas por dia a programação do governo.
A vigilância constante do Big Brother — que em Oceania era expressa na sugestiva frase “O Grande Irmão está de olho em você”, espalhada em cartazes — é, na verdade, referência à ingerência do governo sobre a vida total do indivíduo, cerceando sua liberdade em tudo que não compete ao Estado.
Ter vida privada, vida própria, longe dos olhos do Estado, era um crime em Oceania: em Novilíngua, Novafala em outras traduções (a “nova língua”, criada e permitida pelo partido, com os significados que ele mesmo desejava, o único idioma que todos podiam falar), era o crime de proprivida.
Nós verificamos um pouco disso, por exemplo, há alguns anos, com o Estatuto do Desarmamento, pelo qual do Governo do tempo quis retirar dos brasileiros o direito de defesa; era, em verdade, uma tentativa de desarmar o cidadão para melhor controlá-lo, para dar mais poder ao Estado — uma ingerência claríssima sobre a proprivida dos brasileiros.
Hoje, isso é cada vez mais visível, com os diversos meios de controle e impedimentos utilizados em larga escala nos últimos anos, dos quais, por segurança, não podemos tratar em detalhes, mas cuja eficácia já comprovou-se inexistente.
Em razão disso, quantos não foram os negócios falidos, empregos perdidos e famílias destruídas? Alguém vai consertar as injustiças e os abusos cometidos? Alguém irá reparar os danos sofridos por tantas pessoas prejudicadas?
Não. Simplesmente vão continuar a jogar para baixo do tapete e fingir que nada aconteceu. Esquecer.
Um dos mais interessantes meios de controle do Ingsoc em 1984 e, ao mesmo tempo, o pilar do Partido, era justamente este: o controle do passado. O Ingsoc está constantemente reescrevendo os livros e as notícias passadas em seu favor — possui um órgão só para isso, o Ministério da Verdade, onde trabalha o protagonista, Winston Smith.
O Ministério da Verdade, dia após dia, muda estatísticas de jornais, altera notícias, diz uma coisa e logo depois o contrário, sempre da maneira que o Partido queira. E as pessoas são obrigadas a aceitá-lo, pois é o que está nos registros; se sua memória diz outra coisa, é porque estão loucas. O passado é de um jeito só: do jeito que diz o Partido.
“Quem controla o passado, controla o futuro; quem controla o presente, controla o passado”, é o ditado do Ingsoc.
“A realidade só existe no espírito, e em nenhuma outra parte. Não na mente do indivíduo, que pode se enganar, e que logo perece. Só na mente do Partido, que é coletivo e imortal. O que quer que o Partido afirme que é verdade, é verdade. É impossível ver a realidade exceto pelos olhos do Partido”, dirá um dos personagens a Wiston.
Por que o Partido reescreve o passado para controlar o futuro? Porque o passado é a nossa identidade. É no passado que estão as nossas tradições, nossos valores, transmitidos pelos nossos pais, avós, gerações que vieram antes de nós, e que nos presentearam com a sua própria experiência para não debatermos sobre as mesmas más situações que eles enfrentaram.
É no passado que está a nossa consciência do que aconteceu, do que os nossos próprios olhos viram e do que a nossa razão percebeu.
A tradição é essencial para a vida do homem. Destruir a tradição de uma sociedade é destruir sua identidade; e destruir sua identidade é deixá-la fraca e expô-la ao controle de quem quer que seja.
Destruir a memória de uma pessoa e obrigá-la a reescrever o que está nela é destruir a sua consciência individual em nome da pressão coletiva.
Estamos assistindo ao colapso civilizacional em tempo real…
A crise moral do mundo moderno, essa grande degeneração, é, na verdade, uma crise de tradições: estão destruindo todas as tradições, todos os valores que construíram nossa civilização; estão destruindo o passado, e com ele nossa identidade. E alguém ainda pergunta por que existem tantos regimes totalitários e tantos crimes em nossa época?
Há um outro exemplo, sobre o qual escrevi no ano de 2022, mas que continua bem presente e, por isso, utilizarei aqui mais uma vez para ilustrar o que estamos falando.
Naquele ano, Tucker Carlson, comentarista e analista político americano, falando sobre o problema dos desabrigados, que tornou-se endêmico nos Estados Unidos, ele abordou a culpa dos políticos e ideólogos, cuja abordagem negligente sobre os criminosos está colapsando a civilização. “Estamos assistindo ao colapso da civilização em tempo real”, ele dizia.
Carlson criticou os líderes por alocar milhões de dólares em políticas demagógicas de “moradia para os desabrigados”, em vez de se concentrar em resolver o tratamento da saúde mental e o abuso de drogas — esses problemas fizeram as taxas de desabrigados aumentar em 15% em 2020, número que até o presente não para de crescer.
Criticou também os líderes esquerdistas pelo aumento dos sem-teto e da criminalidade nos EUA, alegando que Seattle, San Francisco e New York e outras cidades progressistas pouco fizeram para mitigar o problema — porque dependem da “política da pobreza” para continuar existindo.
Além disso, culpou o aumento do número de desabrigados e a má administração da comunidade sem-teto das cidades pelo aumento das taxas de homicídios.
De tudo isso, o que se observa, na verdade, é o colapso civilizacional em tempo real.
Como algo tão grande pode acontecer e ninguém se dar conta de tamanho estrago para a sociedade?
Um determinado grupo de titulares de cargos públicos decidiu facilitar a vida nas ruas daquele país, enquanto drogas são consumidas de diversas maneiras.
Os políticos de repente tiveram acesso a uma nova fonte maciça de dinheiro do contribuinte: os muitos bilhões em dinheiro dos trabalhadores para algo chamado de prevenção dos sem-teto. O problema é que essa prevenção, naturalmente, é o oposto do que eles declaram: para receber esse montante enorme de dinheiro, eles precisam que mais sem-teto existam.
E, com isso, eles criaram um círculo vicioso em que a política movimenta dinheiro com uma “boa intenção” que jamais é cumprida e, quando não é cumprida, gera mais dinheiro para os políticos – e os sem-teto são o problema de que os políticos sobrevivem e que, por isso, não se esforçam por resolver.
Permitir que as pessoas defequem em locais públicos e usem drogas ao ar livre, na frente até de crianças, como ocorre nas cidades dos Estados Unidos governadas pelo Partido Democrata, é tanto a causa quanto um sintoma de desordem crescente e caos. É a degradação do pouco de civilidade que ainda nos mantém unidos.
E isso é uma crise fabricada. Não aconteceu por acidente.
O que Carlson denunciava não está muito longe do que assistimos nas grandes cidades brasileiras. É o efeito prático de algo que se chama Janela de Overton.
A teoria leva o nome do seu fundador, Joseph P. Overton, ex-vice-presidente do Centro de Políticas Públicas de Mackinac, Michigan, EUA. O termo foi criado para lidar com aspectos da segurança pública.
Para entendermos a essência da teoria, vamos fazer um pequeno jogo de imaginação.
Pense que em um bairro norte-americano exista uma casa em frente à qual alguns jovens jogam uma tradicional partida de beisebol. Quando menos se espera, por conta de um movimento descuidado do rebatedor, aquela bolinha vai direto para a janela da casa.
O barulho de vidro quebrado denuncia os rapazes e, com medo da bronca, cada um corre para um lado.
Mas o dono da casa era um homem cuidadoso e, em menos de uma semana, consertou o problema na janela. Ao voltarem para ver o estrago, os jovens percebem que o dano foi reparado e simplesmente desistem de jogar por ali, escolhendo um outro lugar, talvez um campo longe de janelas.
Esse comportamento acontece porque, ao consertar a janela, o sinal que o dono envia para os jovens é de que se importa com aquilo e que, talvez, se eles quebrarem de novo, não terão a mesma sorte de se safar do castigo.
O caos é corrigido com a ordem, que o retém.
Agora imagine que o dono da casa fosse um sujeito desleixado e deixasse a janela quebrada mesmo, negligenciando o dano.
Sem um sinal de “eu zelo pela minha propriedade”, aqueles jovens recobrariam o ânimo para jogar no mesmo espaço.
Em pouco tempo, outra tacada faz a bola decolar em direção a outra janela. Duas janelas quebradas e nenhum conserto. Parece mesmo que aquela casa não é tão importante para o seu dono.
Se ele não se importa tanto com a janela, aquela cerca que protege a propriedade, talvez, não faça tanta diferença também. Um outro acidente pode provocar danos a mais um espaço da casa (e, quem sabe, até uma invasão).
O fato é que, em médio ou longo prazo, a casa estará consideravelmente arrebentada.
Ela se tornará um ponto perigoso, porque os pichadores e outras pessoas com instinto de degradar propriedades verão que não existe reação por ficarem ali. Logo vai se tornar um lugar de viciados.
O caos segue seu rumo, como se as leis de entropia da termodinâmica, que afirmam que tudo tende a se deteriorar, se tornassem uma verdade social.
Por isso é importante consertar as coisas logo no início, não deixar os danos ficarem maiores.
O fato é que a cidade de São Francisco, por exemplo, não só está deixando o caos seguir sem rumo, como está incentivando que isso aconteça. Também falava isso Carlson, naquela ocasião.
E não é difícil perceber como isso é verdadeiro. O dinheiro público recolhido por essas campanhas “pró-sem-teto” vai todo para um centro de “prevenção de overdose”. Sabe o que isso significa de fato? Ajudar os desabrigados a ficarem chapados.
Esse centro é um lugar onde os usuários podem inalar a fumaça, engolir ou injetar drogas ilegais, em um ambiente controlado, “prevenindo a overdose”, mas não coibindo o uso. São os primeiros lugares na nação a permitir drogas “supervisionadas”.
Não poderia ser mais simples: os políticos estão tornando muito mais fácil ser viciado em drogas e muito mais difícil de ser um cidadão cumpridor da lei, porque vivem disso e desviam dinheiro através disso.
O que isso lhe diz? Que os incentivos funcionam se você destruir a família tradicional, o trabalho e a ordem social.
A guerra moderna contra as tradições e os valores morais precisa ser vencida pelo resgate dessas mesmas tradições…
Quanto aos viciados, o que você acha que vai acontecer? Essa não é uma questão de política pública vexatória. E a solução é tão simples quanto o problema: Pare de aturar e diga não.
Não, você não pode fumar metanfetamina, não é permitido defecar na calçada. Vá para algum lugar em que os políticos não se importem com seu povo, porque nós nos importamos e é por isso que estamos levando sua barraca para um aterro sanitário e cortando sua “bolsa” hoje.
Você é um viciado em drogas, vamos dar tratamento; arranje um emprego ou vá embora.
Esta é nossa cidade e você não tem permissão para destruí-la. Você não a construiu com suor do seu trabalho, não pode danificar as casas de quem construiu. Se quiser ser tratado e fazer parte da vida social comum, faremos isso por você; se não, não podemos prejudicar a nós e a nossos filhos para favorecer esse modo de vida que destrói o que mais amamos.
Isso não é difícil. Isso funciona. Sabemos que funciona porque é assim que as sociedades funcionam há cerca de 2000 anos. Você não tem permissão para destruir as coisas.
Não é um direito seu. Mas é assim que uma família estável e ordenada ainda funciona até hoje, na privacidade de sua própria casa. O que estão fazendo é um ataque à civilização.
Veja, trouxe apenas um exemplo de uma situação bem concreta do controle totalitário, com ares de “segurança” para a sua vida.
Muitos governos estão numa guerra contra os valores morais e as tradições de nossa nação para destruir sua identidade, levar a sociedade ao caos e instaurar um regime totalitário futuro.
E é isso mesmo o que ocorre. No mundo inteiro. Destruição do passado, repúdio das tradições, caos, crise, imbecilização e manipulação dos homens — daí que o colapso civilizacional seja inevitável.
Destruir o Cristianismo — como se isto fosse possível — é um dos passos para realizar esse intento macabro: é destruir o próprio cimento, a base, o alicerce da Civilização Ocidental. Por isso, todos os grandes totalitários eram inimigos do Cristianismo: Hitler, Marx, Lenin, Stálin, Fidel, Chávez…
A reescrita do passado se verificou em enorme intensidade na Revolução Francesa e no advento da Idade Moderna. A história da Idade Média Católica foi toda reescrita pelos revolucionários iluministas, agora cheia de mentiras e preconceitos; posteriormente, também pelos marxistas, para predispor os homens modernos contra o Cristianismo. Reescreveram, pois, o passado para controlar o futuro.
É por isso que o Ingsoc controla o passado e o altera a seu bel-prazer: destruir o passado é destruir a identidade dos homens e das sociedades. E, então, o homem, sem tradição e valores, se torna um instrumento nas mãos de ideólogos e totalitários.
A guerra moderna contra as tradições e os valores morais precisa ser vencida pelo resgate dessas mesmas tradições, pois são elas que nos dão significado e força. Só assim não seremos como o povo de Oceania: sem força, sem identidade, sem humanidade.
Do contrário, o colapso civilizacional será o nosso destino permanente.
1984, de George Orwell, é uma leitura prazerosa e indicadíssima. Ao mesmo tempo, é um assustador retrato de um futuro sem liberdade, sem pensamento, sem tradição e sem identidade para o qual podemos estar caminhando.
Os exemplos estão aí e são fartos.